Gênese de um poema

Quando estava na fase da pré-alfabetização (será que existe isso???), lembro-me que ficava fascinado pelas letras e palavras, signos então misteriosos, herméticos. Daí que, para me divertir, escrevia pseudo-palavras que não existem em nenhuma língua conhecida - apenas no meu pessoal e experimental vocabulário. Pegava uma folha e uma caneta, e cometia algo como:

abactetabilagectmdaltmedenenmedattabalepolarmina dinacanacnac andarbnaça

Tempos depois, quando começei a entender que duas letras juntas eram uma sílaba, e que significavam alguma coisa, passei a "pescar" naquela zona toda palavras que existiam de verdade - mas só fiz isso, obviamente, quando deixei de copiar as letras e começei a ler/escrever de fato. Por exemplo, na linha acima identifico algumas palavras da nossa língua portuguesa:

teta – lage (entenda-se “laje) - mede - taba - bale (leia-se “bale”)- polar - mina - cana - andar .

Hoje, litros de cerveja depois (é dia dos pais, me permiti!) iria ainda mais longe: juntaria essas palavras surgidas de um impulso dadaísta, formando algo que talvez alguém chame de poema (sou otimista):

MULHER DE TETAS FARTAS

Mulher de "tetas" fartas, generosas
Toma sol na "laje", fogosa, de frente pro sol e de costas pro mundo.
Deitada de olhos fechados, "mede" o tamanho do escuro avermelhado
Cegante, da favela.
Pensa na "taba", na aldeia, na selva, onde roupa é peso morto, supérfluo,
Incômodo a ser tirado e jogado longe num "balé"
De suor e luxúria.
Única veste, pele negra, crua.

Mas muda o tempo, vem temporal próprio da estação,
De fora vem um frio "polar" de chuva e vento sobre o morro;
De dentro vem um calor infernal de "mina" de carvão no verão.
De longe vem o farfalhar das copas, o bater da "cana".
Sabe a mulher de tetas farta que não está em casa,
É cigana,
Sua sina é "andar"!

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Viagem, enfim, colegas. Viagem.

MC, 10/8/2008


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