Tempo inábil

 


Se alguém decidisse juntar todas as palavras supérfluas já escritas, creio que os livros feitos com elas abarrotariam todas as estantes do mundo. 

São muitas as palavras desnecessárias que usamos sem nenhuma avareza. Sem pensar muito no assunto consigo reunir várias. 

Na expressão "sem tempo hábil" qual a necessidade da terceira palavra? O sujeito está "sem  tempo", e isso basta. 

Imagino que alguém que não tem "tempo hábil" pode ter, talvez, "tempo inábil". A diferença, como sugerem os termos, está na habilidade ou na ausência dela. O "tempo hábil" talvez saiba tocar piano, fazer pintura a óleo, resolver equações matemáticas, falar várias línguas e executar a dança do ventre. Já o tempo "inábil" não consegue se relacionar com os outros, tem zero de sutileza, é desastrado como um bêbado e dá notícias tristes sem o mínimo de empatia. É como um elefante numa loja de cristais. 

Outro termo irritantemente inútil é "prazo final". Basta dizer "prazo", não concordam? Na minha opinião, se alguém fala em prazo "inicial" é porque já admite a possibilidade de quebrá-lo. "O prazo inicial para entregar a encomenda é de uma semana, se não chover, não fizer muito calor, se o entregador não tiver dor de barriga ou o Google maps não travar… Mas se o prazo inicial não for cumprido, posso oferecer um prazo intermediário e, em caso de nova falha, até um prazo 'final' ".

Desanimador, não é?

Da mesma forma, acrescentar o inútil "final" ao prazo seria uma tentativa de garantir o cumprimento do prometido. Garantia que muitas vezes não se confirma, principalmente quando falamos em obras públicas. Inútil.

Junte a estes exemplos todas as vezes que  você "subiu pra cima", "desceu pra baixo", "entrou pra dentro" ou "saiu pra fora". Muitos dos vícios de linguagem nada mais são que desperdícios de palavras, como os pleonasmos.

Só admito o desperdício na poesia. Nela, aceito que você diga "da janela lateral do quarto de dormir". Você poderia dizer apenas "quarto", mas acabaria com a métrica, a beleza, o charme do verso. Na poesia o quarto é de dormir, a cozinha é de cozinhar e a cadeira é de sentar. Sem culpa. 

O desperdício é desajeitado e feio. A sobriedade na escrita é elegante. Comunica mais com menos palavras. 

Deixo aqui uma última sugestão: nunca mais "corra atrás do prejuízo"... Se tiver que "correr atrás", que seja de algo melhor. 

 

(Clique no link  e curta uma linda "paisagem da janela")

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