Samambaia

 





Uma samambaia, quarenta, cinquenta anos já! Não sonhava que uma samambaia conseguisse viver tanto tempo! Já existia quando ainda estavam vivos alguns de meus parentes, agora mortos. Agora não, há muitas décadas. 

Já existia quando a casa de alvenaria ainda não. Tudo de madeira, menor, mais simples, mas também mais aconchegante. Samambaia testemunha muda de várias vidas. Testemunha no sentido poético, que no literal não tem como ser, faltam-lhe olhos e ouvidos para testemunhar o que quer que seja. Nós é que adoramos essas prosopopéias... Fazer das coisas nossos irmãos, tão humanos quanto nós.

O tamanho desta samambaia não corresponde à idade. Ela não é um pinheiro. Tem dois metros se medida pela ponta folha mais alta e ereta. De tronco, mesmo, não passa de metro e vinte. É o orgulho de mamãe, "está aqui há muitos anos" ela diz. É a soberana do nosso quintal. 

Se pudesse falar coisas que "presenciou", teria livros e livros para escrever. Fatos tristes co a morte de papai, caído com o coração parado ali mesmo naquele jardim; fatos alegres como os natais da infância, significativos como o dia em que sai de casa para me lançar na vida. Tudo se passou embaixo de suas folhas.

Apesar da idade, não há sinal de cansaço nesta senhora. Muito mais ainda pretende testemunhar, mudamente, enfeitando o jardim como sempre fez. 

(foto de Márcio Correia)

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