Maps


 

Atualmente dependemos da tecnologia como nunca antes. O fato desta afirmação ser uma das mais óbvias já feitas na história da humanidade não diminui sua perfeição. É quase incontestável. 

Dependemos da tecnologia para nos comunicarmos. Para trabalhar, estudar, pesquisar (como será que nossos avós faziam nos tempos das bibliotecas, gente?).

Você provavelmente já usou a tecnologia para se divertir, passar o tempo, comprar algo, vender algo, se exibir, conseguir comida (chama um Ifood!)... Alguns até se valeram dos avanços tecnológicos para encontrar o amor de suas vidas ( deu match!).

Tudo fica por conta dos aplicativos, ou simplesmente apps, a um toque de distância.

Outra maravilha de nossa era é o GPS, provando sempre que a Terra é, sim, redonda. Ou, melhores ainda que o GPS,  os aplicativos de localização que dele derivam e conhecem todos os endereços do planeta. Aposentaram para sempre a figura do frentista-guia.

E é sobre estes apps que nossa história se desenrola. Ou enrola, melhor dizendo.

-------------------o.O.o-------------------- 

Uma rápida pesquisa no aplicativo fez com que Sarmento se sentisse absolutamente seguro sobre a rota a seguir nas férias de fim de ano.

Ele já tinha feito aquela viagem inúmeras vezes, mas por uma rota diferente, sem consultar nenhum aplicativo, sequer um mapa.

Dessa vez resolveu usar a tecnologia e descobriu um caminho alternativo repleto de vantagens:

_Quatro minutos mais rápido pra chegar, e cinco reais mais barato. Acho que evita uma praça de pedágio, ou pelo menos tem tarifas mais em conta _ anunciou à esposa, orgulhoso da própria esperteza. Ignorou a irrelevância de quatro minutos num trajeto de dez horas; antes menos do que mais nesse caso, pensou.

A mulher desconfiou logo daquela "esmola" grande demais:

_ Mas será que é uma estrada boa? Não tem obras no caminho? Nenhuma pegadinha?

_ Obras, tem no caminho que fazíamos sempre, respondeu o marido. _ o app avisou! Não é demais?

Ah, mulher de pouca fé. 


-------------------o.O.o--------------------

Pelos primeiros duzentos quilômetros o caminho era idêntico ao da última viagem, sem surpresas. Mas dali adiante começavam a aparecer as diferenças. 

O tráfego de veículos pesados aumentou de repente, a pista deixou de ser duplicada, só pequenos trechos tinham uma faixa extra para permitir ultrapassagens menos perigosas. A proximidade de caminhões monstruosos se tornou uma pressão contínua. 

Alguns quilômetros adiante o tráfego parou repentinamente. 

_ Tem obras na pista, falou a esposa. 

_ Uai, o aplicativo não avisou, constatou Sarmento.

_ Também não avisou que essa rodovia não é duplicada, cutucou a esposa, irônica. E, não satisfeita: 

_ Estrada duplicada nesse país é exceção. A regra é pista simples, isso quando tem pista! Tem estrada que é uma coleção de buracos. Você não está na Suíça!

Sarmento engoliu aquele comentário com gosto de crítica. Calado. Mereceu. A esperança era que logo pegariam um trecho duplicado, tinha certeza. 

Pegaram , de fato...

Mas não se estendeu nem por 10 quilômetros. 

Na sequencia, a volta do desconforto da pista simples. 

_ Estrada duplicada nesse país é raridade. Você não está na Suíça, relembrava a esposa. 

Passados muitos quilômetros, o aplicativo indicou uma mudança de rumo. Curva de 90 graus à esquerda para um trecho, afinal, duplicado. "Agora vai", pensou Sarmento, jogando um olhar desafiador para a esposa. 

Está certo que o asfalto não era grande coisa, mas, que diabo, era uma rodovia duplicada! 

Aquela alegria parcial, porém, durou pouco. O aplicativo indicou outra estrada à direita. Uma "MG" número tal. A pista, única, estreitou-se imediatamente. O asfaltou deteriorou-se como por encanto debaixo das rodas. 

A esposa não perdoou:

_ Não é possível que seja por aqui! Você deve estar sem conexão com a Internet! Cuidado com os buracos, que se o carro quebra aqui no meio do nada, não tem nem como pedir socorro. 

De fato não havia nada à vista. Campinas com mato rasteiro, uma e outra lavoura, atoleiros e aquela estradinha de nada, mais parecida com um atalho do que com uma rodovia. 

Dela saíram para outra idêntica. Ficaram presos atrás de um lento treminhão cheio de cana-de-açúcar, até ele sair do caminho e embocar para uma usina de álcool. 

Mais buracos. Solavancos. Outra "MG" péssima. Crateras no chão. Um caminhão atolado na beira da estrada, num trecho praticamente sem asfalto nenhum. Se até caminhão atola por ali, que chance teria o carrinho de Sarmento?

A essa altura, ele já estava mais que arrependido. "Que armadilha! Cinco reais a menos? Quatro minutos mais rápido? Se conseguir chegar, né, seu aplicativo dos infernos!"

Ao final de um longo suplício, finalmente apareceu a saída daquele labirinto de "picadas de burro". 

Entrar em São Paulo foi como transpor os portões do paraíso. 

Dali por diante, caminho duplicado, asfalto bom, sinalização em ordem até a chegada. Trajeto tão sensacional que rendeu até o perdão da esposa. Seria perfeito, não fossem alguns dos pedágios mais caros do Brasil no itinerário.

_ E tu acha que alguma coisa sai de graça nesse país? Você não está na Suíça, Sarmento!


Comentários

  1. Ahahahahah maldito!!! Affff horas de medo nessa rodovia!!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Mas que chegamos quatro minutos mais cedo, chegamos 😅😅

      Excluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas