Tarde cedo


 Falou sem pensar, de bate-pronto, as palavras praticamente escapulindo boca afora, como se tivessem vontade própria:

_Tá ficando tarde cedo! _ afirmou, esperando a confirmação da esposa.

_Tarde cedo? _ perguntou ela, com um ar de deboche na cara.

O marido não se abalou:

_Tarde cedo. Tarde cedo. Sim. Olha o relógio: já marca mais de sete da noite. Não era pra ser nem seis horas a essa hora. Olha o céu! Ainda nem escureceu! 

_Você quis dizer que o tempo tá passando rápido _ comentou a mulher, entre risos.

_ O que eu disse está dito! _ respondeu o marido, de mau humor. 

O fato é que, não importa a forma como se expressassem, os dois sentiam a mesma coisa: o tempo andava desembestado ultimamente, numa velocidade anormal de trem-bala fora dos trilhos...

Acontecia sempre que o casal se divertia, e era esse o caso. Ambos em férias, com esse tal tempo sobrando pra jogar pela janela... Com tamanha fartura de tempo, acabou que tornaram-se avarentos dos dias, das horas, até dos minutos.

O que queriam mesmo era que o tempo parasse, deixasse de escorrer por entre os dedos deles como a areia de uma ampulheta... Desistisse de fugir, como um punguista tentando escapar da polícia. 

Mas se assim fosse, não seria o tempo, esse deus implacável que rege a vida da gente. O máximo que se pode fazer é tentar aproveitar a convivência com ele, enquanto ainda se faz disponível.

  



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